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Contra a terceirização, pela erradicação do trabalho escravo, a revogação integral da “reforma” trabalhista e o reconhecimento dos plenos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras em plataformas digitais

Mais uma vez o Brasil se vê envolvido com notícias de trabalho análogo à escravidão, e muitas pessoas e instituições se mostraram chocadas e surpresas com o fato. 

Ocorre que, trágica e infelizmente, esta é uma situação recorrente no Brasil, sendo que, na quase totalidade das vezes, estão envolvidas empresas (nacionais e estrangeiras) de grande porte econômico, pois a própria dinâmica deste ato criminoso, que projeta uma “produção em larga escala”, requer enormes aportes financeiros, inclusive para promover o aliciamento e manter o aparato repressivo.

E o instrumento jurídico que se coloca a serviço do grande capital para esta prática é a terceirização, que serve, sobretudo, para criar um obstáculo formal à sua responsabilização. Não é a toa, portanto, que as empresas e instituições alvo das denúncias de trabalho escravo sempre lançam o argumento de que não têm controle ou responsabilidade pela situação, e, principalmente, que sequer conheciam a situação dos trabalhadores, porque estes não eram seus empregados e sim trabalhadores terceirizados.

Diante desta realidade, que gera o vergonhoso fato de que nenhuma das grandes empresas envolvidas com o trabalho escravo consta da lista “suja” organizada pelo Ministério do Trabalho, não são suficientes as manifestações de repúdio e de indignação.

É preciso detonar a base jurídica sobre a qual ela se sustenta. 

Estes atos criminosos, cuja persistência põe em descrença quaisquer promessas de universalização dos direitos democráticos e sociais, são parte de uma ampla cadeia de precarização do trabalho que, inclusive, foi intensamente incentivada por muitos daqueles que se dizem chocados com as notícias. Afinal, a terceirização, que está na base do crime, foi expressamente defendida como uma medida modernizadora das relações de trabalho.

Os dados da precarização do trabalho são alarmantes. E há de se levar em consideração que grande parte sequer é retratada em dados. Entre 2018 e 2022, foram resgatadas 7541 pessoas em condições análogas a escravidão, sendo que 80% se reconhecem como negros (pardos e pretos). Até 2018, 22% da força de trabalho formal já era terceirizada. Hoje estima-se mais de 12,5 milhões de terceirizados, sendo que uma grande maioria especialmente no setor de serviços é composta por mulheres.

A terceirização foi também o caminho decisivo de entrada para o trabalho intermitente e para o trabalho uberizado em plataformas digitais, no qual estima-se que hoje estejam cerca de 1,5 milhões de trabalhadores, na situação do mais completo afastamento dos direitos trabalhistas. Por isto, inclusive, é fundamental que a regulamentação dessa forma de trabalho parta do reconhecimento do vínculo de emprego e da garantia de plenos direitos trabalhistas, sem permitir, por certo, que esta regularização se dê pela via da intermediação de mão de obra. 

E vale destacar que toda essa precarização avançou ainda mais desde que, em 2017, se aprovou a mal denominada “reforma” trabalhista, a qual, também por isso, precisa, urgentemente, ser revogada.

Nos últimos anos, marcados por retrocessos, muito se tem debatido sobre a defesa de direitos democráticos e sociais, contra o avanço da desigualdade, a reprodução da miséria e a ampliação da precarização das condições de vida de grande parte da população, notadamente dos setores já mais duramente atingidos por ela, como são as negras e negros, as mulheres e imigrantes. Mas a precarização e terceirização do trabalho segue em ampla escala nacionalmente. 

As trabalhadoras e trabalhadores terceirizados têm salários muito menores, piores condições de trabalho, e não têm acesso aos direitos e serviços direcionados (embora nem sempre efetivamente observados e também já bastante reduzidos e por vezes inadequados) pelos demais trabalhadores, incluindo alimentação, transporte, saúde, lazer, creche e cuidados para os filhos. Estão em permanente insegurança sobre o próprio emprego e até mesmo sobre o recebimento de seus salários, frente às frequentes demissões, alterações arbitrárias e até punitivas dos locais de trabalho e calotes realizados pelas empresas terceirizadas. 

A terceirização é realizada em larga escala inclusive em diversas instituições do Estado, como as universidades que, contraditoriamente, têm se arrogado um papel de protagonistas na defesa da democracia e de direitos sociais. Nelas se somam casos como o da USP, onde milhares de trabalhadoras terceirizadas não podem sequer ir trabalhar usando o ônibus circular disponibilizado aos trabalhadores efetivos, professores e estudantes – uma situação de evidente segregação. Ou da Unicamp, onde uma trabalhadora terceirizada morreu trabalhando, e suas colegas que reagiram realizando uma greve contra a precarização do trabalho foram demitidas em massa.

Por isso, somos radical e inconciliavelmente contra a terceirização do trabalho e propugnamos pela punição dos empresários escravocratas, como um chamado a toda a população; e considerando que as comunidades universitárias têm um papel importante a cumprir, chamamos à reflexão e à ação, para a urgência da superação desse grave problema, que é a terceirização. 

Deixando claro que somos refratários à terceirização e não às(os) trabalhadoras(es) terceirizadas(os), defendemos, como efeito, a plena igualdade de direitos para as trabalhadoras e trabalhadores terceirizados. Igualdade salarial entre homens e mulheres, negros e brancos. Igualdade de acesso aos equipamentos de saúde, educação, lazer, alimentação e transporte oferecidos pelos locais de trabalho. 

A eliminação da terceirização deve ser promovida sem ameaçar os empregos de trabalhadoras e trabalhadores, que são uma grande maioria de mulheres e negros, ou seja, há que se garantir sua efetivação com plenos direitos aos quadros de empregados das empresas responsáveis pelos locais de trabalho, pois a solução desse problema não pode se dar impondo um prejuízo ainda maior a quem mais sofreu com ele por décadas. 

Trata-se de uma tarefa urgente, que, embora já se realize com enorme atraso, apresenta-se como uma forma de reparação política para com estes(as) trabalhadores(as), além de se constituir um importante e necessário avanço na condição de vida da classe trabalhadora do país, assim como uma reviravolta com relação aos rumos impostos pela “reforma” trabalhista, indo, pois, na direção da defesa efetiva de direitos democráticos e sociais.